Plataformas

Humanidades

Opinião Iyaleta: Por uma Primavera das Cidades Resilientes

Não podemos deixar de olhar para a Primavera como a estação das flores, ciclo dos nascimentos e da luminosidade solar quente que energiza sementes, florescendo as paisagens: é assim que acolhemos a estação. Porém, estamos no tempo presente das mudanças climáticas, um tempo que nos impacta e nos coloca em emergência climática. 

Esta é a realidade para as Humanidades nas cidades tropicais do Sul Global, conforme, previsão evidenciada há dois anos pelo Sexto Relatório de Avaliação (AR6) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Pelas evidências, nos alertou quanto aos impactos e efeitos das mudanças climáticas e das vulnerabilidades frente aos fenômenos e eventos climáticos extremos, chamando atenção às condições humanas de vida, à situação das áreas urbanizadas e aos perigos para a biodiversidade. Especialistas responsáveis pelos estudos de impactos, adaptação e vulnerabilidades do AR6-IPCC (2022), apresentaram em alta, média e elevada confiança, que os fenômenos extremos de calor, incluindo as ondas de calor, estão se intensificando nas cidades e agravaram os fenômenos de poluição atmosférica e limitaram o funcionamento das principais infraestruturas nas cidades do Sul Global.  

Os impactos observados se concentram nas populações residentes em áreas urbanas empobrecidas e em condições de pobreza extrema nas áreas reconhecidas como aglomerados informais. Nestas, as infraestruturas, incluindo os sistemas de transportes, saúde, água, saneamento e energia, estão comprometidas por fenômenos extremos e de evolução lenta, com consequentes perdas econômicas e aumento das vulnerabilidades dos serviços, o que impacta profundamente o bem-estar social e a biodiversidade.  

Nesse cenário é preciso atenção ao baixo investimento nos planos, projetos e políticas efetivas que garantam as condições de ambição global para reduzir a temperatura do planeta em até 1,5°C antes de 2030. Esta depende de olharmos para as cidades e reconhecer o estado de vulnerabilidade diante dos eventos climáticos extremos de curta e média duração, caracterizado por períodos longos de aquecimento dos oceanos, pelo território urbanizado desigual, pelas secas, pelas chuvas intensas, pelas inundações e pelas longas estiagens. 

Não podemos esquecer que 2023 foi o ano mais quente da história de nossos registros climáticos. No relatório publicado no mês de junho a Organização Meteorológica Mundial (OMM), explica que temos 80% de probabilidade de a temperatura média global anual exceder temporariamente em 1,5°C dos níveis pré-industriais durante pelo menos um dos próximos cinco anos. A temperatura média global próxima à superfície deverá ser entre 1,1°C e 1,9°C mais alta entre 2024 e 2028, comparada com o período de referência 1850-1900 (Brasil, 2024). 

Os dados da OMM evidenciam que estamos vivendo os efeitos e impactos do aquecimento da Terra, que reduzem as condições da biodiversidade de se regenerar, e, nas áreas urbanizadas, reduzem as condições de saúde e segurança para meninas, mulheres, crianças, adolescentes, jovens e pessoas idosas. Um cenário de acúmulo de desigualdades que adensa as perdas materiais, de vida, de biodiversidade, de cultura, de patrimônio imaterial e de futuro. 

O relatório World Population Prospects 2022 publicado pela ONU-Habitat no Dia Mundial da População, estima que cerca de 56% da população mundial, ou seja, 4,6 bilhões de pessoas residem em áreas urbanizadas, com estimativa de em 2050 esse contingente aumentar para 68%. Na América Latina, estima-se que 81% das pessoas residem em áreas urbanizadas. E Brasil, segundo o Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 87,8% da população vivencia a realidade das áreas urbanizadas.  

Frente à caminhada para a 29ª Conferências das Partes (COP29) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), em Bakú no Azerbaijão, no período de 11 a 22 de novembro de 2024, e a corrida para COP30 em Belém (Brasil), em 2025, temos um grande desafio na geopolítica para transição justa globalsuperar o atraso de nove anos nas negociações das Metas Globais de Adaptação do Acordo de Paris. Não deveria ser difícil ter consensos nessa matéria, mas, persiste a dificuldade, já que não é possível haver alinhamento de responsabilidades mútuas diante dos ciclos de carbonização desiguais, que emergiu economias resilientes no Ocidente, hoje não solidárias financeiramente com a eliminação das desigualdades e as vulnerabilidades das cidades no Sul Global. 

A condição atual é que precisamos da Humanidade para mover até 2030, com o “ investimento anual em soluções baseadas na natureza precisando triplicar globalmente, passando de US$ 200 bilhões para US$ 542 bilhões”, para alcançar 4 bilhões de pessoas em vulnerabilidades climáticas. Esta é a Race To Resilience (Corrida para a Resiliência). É imperativo que as métricas para financiar os planos de adaptação climática, sejam vistas pelos fundos climáticos de doação e não pela financeirização climática da miséria e da pobreza, pois, as cidades precisam da transição para adaptação e não da transição que invisibilize nas áreas urbanizadas os aglomerados subnormais, no Brasil, por exemplo, denominados de favelas e comunidades urbanas 

Nessa construção, a Associação de Pesquisa Iyaleta, organização da sociedade civil observadora integrante da UNFCCC, iniciou em 2022, a primeira fase da pesquisa Adaptação climática: uma interseção Brasil 2030. Com sua  conclusão no primeiro semestre deste ano, iniciamos a segunda fase [2024-2026], com o objetivo de contribuir com estratégias e caminhos de alcance da adaptação climática nas cidades: com análises qualitativas e quantitativas das estratégias, das metas e indicadores de políticas públicas para a implementação dos Planos Nacionais de Adaptação – PNA; e sobre as contribuições nacionais determinadas – NDCs (2025 e 2030), apesar das Nações terem o compromisso de em 2025 apresentarem metas de redução de GEE para 2035, nos responsabilizamos em olhar as ambições até 2030, compreendendo que será o ano de fechamento dos indicadores do Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – Agenda 2030, que até o momento alcançou apenas 17% das metas planejadas. 

A pesquisa Adaptação Climática: uma intersecção Brasil 2030, nesta fase, tem o desafio de interseccionar bases de dados, fomentar pesquisas e prover a capacitação para o acesso as políticas de adaptação climática em escala nacional e nos territórios, considerando os determinantes territoriais e populacionais, a infraestrutura urbana, as condições de saúde e de moradia, condições ambientais, o acesso em equidade a eletrificação e energia renovável, ao saneamento, ao abastecimento de água e ao tratamento de resíduos, entre outros. 

Pelas Ciências, nos colocamos a pensar na Primavera que aquece a Terra e os trópicos em saúde, para germinar as ciências que proverão formas e estruturas de adaptação climática. Adaptação esta pautada na transparência, na capacitação e na realização de metas de redução dos GEE que desaqueça o Planeta com a eliminação das desigualdades nas cidades, hoje com as atmosferas poluídas e os territórios aquecidos pela carbonização extrativista e exploratória dos ciclos hegemônicos industrial-ocidental.  

Por isso, somos Raio de Sol e acreditamos que é preciso polinizar na Primavera!  

Coordenação Científica  

Iyaleta – Pesquisa, Ciências e Humanidades